Escola Politecnica Joaquim Venâncio / Fiocruz

Portfólio de Práticas Inspiradoras em Atenção Psicossocial

Desenvolvimento e oferta de curso semipresencial de auriculoterapia para profissionais da saúde da atenção primária no Brasil

Capacitação em larga escala em auriculoterapia para profissionais da atenção primária no SUS. 
Florianópolis - SC
  • Campo do Saber
  • Campo de Prática
  • Público Alvo

 

 

Autores: 
Charles DalcanaleTesser; Lúcio José Botelho; Ari Ojeda Ocampo Moré; Emiliana Domingues Cunha da Silva; Fátima Pelegrini; Melissa Costa Santos 
auriculoterapia.sus@contato.ufsc.br 
Instituições vinculadas: 
Universidade Federal de Santa Catarina, Ministério da Saúde e Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis O curso foi oferecido na modalidade semi-presencial com uma etapa a distância e outra etapa presencial realizadas em polos-regionais espalhados em todos os estados do Brasil. Até o momento, foram formados cerca de 9200 profissionais de saúde (de nível superior) da atenção primária à saúde de quase todos os estados brasileiros, atuantes em 1797 (cerca de 1/3 dos) municípios do país. 
Resumo afetivo: 

A auriculoterapia é uma prática de fácil acesso, baixo custo e boa aceitação por parte dos usuários, além de já apresentar muitos estudos comprovando sua eficácia para diversos problemas de saúde, incluindo, também, dores agudas e crônicas e saúde mental. Neste caso, pode ser um aliado para diminuição de sintomas como ansiedade, depressão e stress, entre outros.

A oferta do curso de auriculoterapia contribui para ampliação do cuidado ao paciente, aumentando o leque terapêutico por parte dos profissionais da área da saúde da atenção primária. Como desafios destacam-se a possibilidade e a dificuldade de expandir a oferta do curso em número suficiente para todos os profissionais do SUS interessados, alcançando todas as áreas e regiões de mais difícil acesso; e a consolidação desta prática a nível nacional na atenção primária, além de inserir disseminadamente o seu nos cursos de graduação da área da saúde.

Contexto: 

O curso foi construído por uma equipe que é em parte da universidade (pessoal de tecnologia da informação, pessoal administrativo, professores – coordenação - e acupunturistas do hospital universitário) e em parte constituída por equipe multiprofissional de acupunturistas com experiência atual ou prévia na APS, que tinham se envolvido com atuação e ensino de auriculoterapia na atenção primária à saúde (APS) no município. Assim, o nosso contexto é o do trabalho na APS e o de ensino e pesquisa na área da saúde, com interface com as práticas integrativas e complementares (PIC), pela trajetória dos membros do grupo. Metade do nosso pequeno grupo inicial (composto de dois professores, uma enfermeira, duas farmacêuticas e um médico acupunturista) atuou ou atua na APS e se envolveu com prática e ensino de auriculoterapia ali.   

A auriculoterapia é uma técnica de microssistema, muitas vezes associada à medicina tradicional chinesa, geralmente usada mais por acupunturistas, que consiste em estimulação pontual mecânica (em geral por meio de sementes vegetais esféricas aderidas à pele) em pontos determinados do pavilhão auricular, de acordo com a queixa do paciente. Frequentemente a auriculoterapia, assim como outras PIC, não estão incorporadas à formação dos profissionais nem à cultura organizacional dos serviços de atenção primária à saúde (APS).    

Com isso, destacamos a importância da oferta deste curso, que propicia oportunidade para os profissionais da atenção primária não só contatarem, mas também aprenderem este conhecimento e essa forma de cuidado clínico. Ele permite a qualificação e ampliação do leque terapêutico no SUS, podendo ser utilizada em diversas condições de saúde muito comuns na atenção primária, mas também em outros serviços especializados e hospitalares (embora o curso por ora esteja focado na APS).

Como vantagens, destaca-se o fato de ser de baixo risco (pois não é invasiva) e de fácil realização, com ótima aceitação e mínimos efeitos adversos, podendo ser utilizada em vários locais, como ambiente de cuidado individual e/ou coletivo.

Motivações: 

O curso de capacitação em auriculoterapia surgiu de uma demanda do Ministério da Saúde a partir de experiências exitosas no município de Florianópolis-SC. A Secretaria de Saúde do município, após legitimar oficialmente (por portaria) e iniciar um processo de expansão das PIC na atenção primária em 2010, apoiou a criação de um curso presencial de auriculoterapia rápido, ministrado inicialmente por um médico de família acupunturista que atuava em um centro de saúde do município, para os demais profissionais da APS. Foram realizados alguns cursos presenciais de sensibilização e capacitação de auriculoterapia para os profissionais da atenção primária, obtendo boa aceitação por parte deles e dos usuários, que começaram a receber a oferta dessa técnica nos Centros de Saúde. A partir daí o MS fez uma parceria com a UFSC em 2015 e foi criada uma equipe técnica, formada por profissionais da área, para criar um curso a distância (via internet), ampliando a abrangência para todas as regiões e disseminando a técnica por todo Brasil. Foi elaborado um projeto didático-pedagógico para a criação de um curso de capacitação em auriculoterapia para profissionais de nível superior da área da saúde do SUS na modalidade semi-presencial. O curso foi estruturado em 75 horas-aula na modalidade a distância (EaD), divididos em cinco módulos sequenciais, e 5 horas de aula prática presencial, que ocorre após a finalização da etapa EaD. O curso foi baseado em três abordagens a saber: reflexologia, medicina tradicional chinesa e auriculoterapia sob a ótica da biomedicina. A etapa presencial é realizada em vários polos regionais espalhados pelo país, ministrada por preceptores previamente capacitados pela coordenação do curso. Consiste em atividades estritamente práticas, e é organizada nas semanas posteriores ao término da etapa EaD.

Parcerias: 

O curso é uma parceria da UFSC com o Ministério da Saúde e Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis. O público alvo são os profissionais de nível superior da área da saúde da atenção primária do SUS, incluindo as equipes de NASF.

Objetivo: 
  • Instrumentalizar os profissionais a iniciar a prática da auriculoterapia;
  • Implantar e/ou implementar a prática da auriculoterapia em várias unidades de saúde do Brasil;
  • Sensibilizar os alunos e possibilitar o contato com uma Prática Integrativa e Complementar;
  • Refletir sobre novas formas de cuidados;
  • Interiorizar a prática da auriculoterapia, fazendo com que mais alunos tenham acesso ao curso e,
  • Criar novos níveis de aprofundamento do curso, que atualmente estão em desenvolvimento.
Passo a passo: 

Após o primeiro ano que se concentrou no desenvolvimento da estrutura e dos conteúdos do curso, a partir do segundo ano o método do curso envolvia 5 módulos teóricos EAD sequenciais:

Módulo 1- Introdução ao curso e às PIC e sua inserção na APS;

Módulo 2- Reflexologia da orelha; 

Módulo 3- Auriculoterapia na medicina tradicional chinesa;

Módulo 4- Auriculoterapia na biomedicina, com abordagem da neurofisiologia e evidências científicas. 

Módulo 5- Usos da auriculoterapia na APS

Cada módulo é pré-requisito para o seguinte e com a conclusão da etapa a distância o aluno está apto a participar da etapa presencial, que é composta de 5 horas de aula, na qual são oferecidas:

- Rápida revisão teórica sobre os módulos estudados na etapa EaD;

- Atividades práticas entre os alunos,  

- Discussão de casos clínicos.

A etapa presencial é ministrada por preceptores previamente treinados pelo curso. 

Como recursos pedagógicos do curso, destacam-se:

-Disponibilização de material didático original (uma apostila por módulo), incluindo as três abordagens mencionadas;

-Contextualização da auriculoterapia na Atenção Primária à Saúde;

-Confecção e disponibilização de um mapa auricular plastificado que é fornecido ao aluno no dia do encontro presencial;

-Disponibilização de placa para a montagem das sementes da auriculoterapia para os alunos do curso, no intuito de instrumentalizar e incentivar o início imediato dos atendimentos em seus locais de saúde após o curso. 

Efeitos e resultados: 

De todos que são matriculados no curso, aproximadamente 75% o deles concluem. Após 3,5 anos de oferta do curso (fim de 2019), quase 10 mil profissionais foram capacitados, com realização de polos presenciais em mais de 30 cidades em todas as regiões do país. Esses profissionais egressos atuavam no SUS quando fizeram o curso em 1797 municípios.

Pesquisa foi realizada com os alunos após os dois primeiros anos do curso, em que foram convidados por e-mail a participar 5.703 ex-alunos e responderam ao questionário 2.982 deles (52%). A maioria dos respondentes eram mulheres (86%), relativamente jovens, com idade média de 36,8 anos. As profissões mais presentes eram enfermeiros (35%), fisioterapeutas (14%), psicólogos (8%) e médicos (7%). Concluíram a etapa a distância 95% dos respondentes; sentiram-se aptos a praticar auriculoterapia após o curso 79% deles e o fizeram 73% deles. Destes que iniciaram a prática da auriculoterapia, 93% referiram boa ou ótima aceitação pelos usuários e 96% relataram boa ou ótima efetividade clínica. 

Esses números e os relatos frequentes de satisfação dos profissionais com o curso e com a prática da auriculoterapia, bem como a grande demanda reprimida nas últimas edições do curso indicam um êxito da iniciativa e uma grande aceitação dos profissionais e da população.

A capacitação em auriculoterapia é possível via ensino semipresencial e permite ampliar as opções terapêuticas, contribuindo para a integralidade do cuidado. A experiência mostrou que há possibilidade de expandir o uso da auriculoterapia em larga escala, ampliar o acesso a essa prática nas diferentes regiões do Brasil e torná-la uma PIC disseminada na atenção básica. A procura pelo curso é alta, visto o número crescente de inscritos em nossas edições, mostrando assim, o interesse dos profissionais em implantar/implementar esta técnica em seus locais de atuação. A oferta do curso será continuada pelos próximos dois anos. 

Ainda que a oferta do curso esteja mantida, o ritmo de expansão dos egressos é lento frente à grandeza da atenção primária à saúde brasileira (quiçá para o SUS como um todo), e ainda não foi iniciada em maior escala a inserção do ensino dessa técnica nos cursos de graduação em saúde das universidades públicas brasileira. Estes são alguns dos desafios a serem enfrentados pelo Ministério da Saúde e a equipe do curso para os próximos anos.