- Campo do Saber
- Campo de Prática
- Público Alvo
O Acompanhamento Terapêutico (AT) é uma modalidade da clínica que se propõe a acompanhar um sujeito no seu cotidiano. Tem surgimento nos anos 60, na Argentina e no Brasil, e se relança entre nós no contexto da Reforma Psiquiátrica e dos movimentos de desinstitucionalização. Pauta-se pelo cuidado em liberdade e visa produzir autonomia, ampliação de laços e possibilidades de vida e apropriação dos espaços públicos e privados. Por não ficar restrito às quatro paredes da clínica tradicional, o AT é uma clínica que se faz com o corpo, dando borda à experiência do encontro e habitando o cotidiano dos territórios geográficos e existenciais. No AT, nós investimos na construção de um cuidado que se faz mais horizontal, lado a lado - acompanhado e acompanhante são responsáveis pelo que se produz no encontro. A construção e rearticulação das redes de cuidado é um dos desafios que se apresentam ao trabalho. Diante do cenário atual de precarização e endurecimento dos serviços, muitas vezes os acompanhados têm dificuldade de acessá-los, e, quando acessam, frequentemente encontram protocolos e narrativas cristalizadas que limitam as possibilidades de cuidado. As alegrias na prática do AT aparecem no detalhe, no cotidiano dos encontros e na possibilidade de ampliação destes, tanto do acompanhado com as pessoas próximas e com os trabalhadores dos serviços, como dos acompanhantes na constituição de parcerias, na ampliação dos espaços de cuidado em liberdade e afirmação de uma clínica política. O Projeto ATnaRede, vigente desde 1998 vinculado a uma universidade pública em parceria com serviços das políticas públicas da cidade, ao mesmo tempo que oferta essa modalidade de cuidado a usuários/as desses serviços, constitui uma experiência potente de formação para o trabalho em saúde mental, por meio de uma relação intensiva com esses usuários em seus contextos cotidianos de vida, na perspectiva da clínica ampliada, de forma territorializada e em rede.
O Projeto ATnaRede propõe-se como campo de estágio curricular em psicologia e como cenário de prática de residências multiprofissionais em saúde, acolhendo as demandas de AT oriundas da rede pública de serviços de saúde, mas também da rede intersetorial de assistência social, educação, justiça, na perspectiva da desinstitucionalização e da inclusão social. A cada ano, um grupo de estagiários, extensionistas, residentes, pós-graduandos e profissionais de psicologia e áreas afins, realizam AT de usuários da rede pública intersetorial, contando com um espaço semanal de supervisão do trabalho na universidade, além da participação nas reuniões de equipe e reuniões em rede dos serviços parceiros de nosso Projeto. O projeto situa-se no ponto de intersecção da extensão, do ensino e da pesquisa na universidade, na medida em que:
1) oferta a modalidade clínica do AT para os serviços de saúde e da rede intersetorial;
2) forma estudantes e profissionais para o cuidado em saúde mental, territorializado e em rede, conforme aos princípios do Sistema Único de Saúde;
3) produz conhecimento que concerne, por um lado, à experimentação e análise das redes operadoras do cuidado em saúde mental nos territórios em que atua, e, por outro, à sistematização e aperfeiçoamento do AT como tecnologia leve de cuidado, a operar junto aos territórios de vida dos usuários, voltada ao diagnóstico (situacional), ao tratamento (psicossocial), a exercícios de cidadania e autonomia.
Vivemos um contexto de retirada de direitos, retrocesso na reforma psiquiátrica brasileira e precarização e endurecimento dos serviços públicos, realidade que atravessa nosso trabalho e nos desafia cotidianamente a criar novas estratégias de cuidado em saúde mental coletiva. O AT é uma dessas estratégias com a potência de fazer andar a vida a contrapelo dessa realidade, uma clínica-política no contrafluxo dos higienismos, da medicamentalização e apagamento do que difere da norma.
Como dissemos antes, o AT se relança em nosso contexto voltado às pessoas que estavam institucionalizadas por muito tempo em manicômios, com objetivo de dar suporte ao processo de voltar a viver em liberdade. Foi-se desenhando, assim, uma prática de cuidado em território e de defesa do direito da loucura à cidade, alargando os modos de habitá-la para que a marca da diferença que a loucura carrega nela possa ter lugar. Com o tempo, o AT foi expandindo sua prática para outras demandas, como a de pessoas com problemas decorrentes do uso de álcool e outras drogas, ou em cumprimento de medidas alternativas, ou crianças e adolescentes em processos de inclusão escolar, entre outros. Atualmente, mesmo com a diminuição dos hospitais psiquiátricos através da Reforma Antimanicomial, as práticas manicomiais, muitas vezes, seguem presente no dia a dia dos serviços, nas relações familiares e institucionais. Dessa forma, o AT continua sendo necessário em muitos casos, da mesma forma como no início dos processos de desinstitucionalização. Observamos situações de institucionalização, seja de pessoas que não conseguem sair de casa ou que, mesmo saindo, não têm sua autonomia plena, por diversos motivos. A prática do AT se propõe a conhecer e estar junto com os acompanhados nessa realidade, buscando promover autonomia e cuidado em liberdade.
Ao acompanhar alguém, buscamos conhecer sua rede ou tecê-la junto a pessoa. Nesse processo, encontramos instituições e/ou pessoas com quem podemos contar na construção do cuidado, tais como CAPS, CREAS, CRAS, ESF, Equipe técnica do Judiciário, entre outros. Assim, os encontros se dão entre acompanhantes e acompanhados, mas também entre estes e as parcerias possíveis na ampliação dos espaços de cuidado em liberdade e afirmação de uma clínica política. Nessa relação de parceria, quando nós não temos vagas para acolher um novo caso que nos é solicitado, realizamos rodas de conversa com os serviços que nos procuram para pensar juntos possíveis caminhos de cuidado.
O AT tem como principal objetivo o cuidado em liberdade da pessoa acompanhada, buscando a produção de autonomia, ampliação de seus laços e possibilidades de vida e conexão com os espaços públicos, comunitários, familiares, pessoais. O Projeto ATnaRede desenvolve a prática do AT tendo como objetivos:
1) oportunizar a formação em Saúde Mental Coletiva, multiprofissional e interdisciplinar, articulando conhecimentos e práticas da atenção psicossocial vinculados aos processos de desinstitucionalização e inclusão social;
2) ofertar a modalidade clínica do AT para os serviços de saúde e da rede intersetorial, incidindo sobre a construção dos Projetos Terapêuticos Singulares;
3) produzir conhecimento concernente à experimentação e análise das redes operadoras do cuidado em saúde mental nos territórios em que o Projeto atua;
4) produzir conhecimento referente à sistematização e aperfeiçoamento do AT como tecnologia leve de cuidado, a operar junto aos territórios de vida dos usuários, voltada ao diagnóstico (situacional), ao tratamento (psicossocial), a exercícios de cidadania e autonomia.
Coordenado por duas docentes, o projeto ATnaRede caracteriza-se por um modo de gestão compartilhada, em que todos os seus integrantes se fazem responsável pela condução do projeto e de seus processos de trabalho. O grupo, reunindo docentes, estagiários, extensionistas, residentes e pós-graduandos, encontra-se semanalmente para compartilhamento dos ATs em curso. Nesses encontros, é a metodologia de construção coletiva dos casos que dá suporte à experiência do AT e indica a direção clínico-política do trabalho. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que nós acompanhamos os usuários, também nos acompanhamos como colegas, compartilhando experiências e pensando possíveis caminhos coletivamente. A relação entre docentes e estudantes ou profissionais em formação, nesse caso, sem eximir-se da responsabilidade que recai sobre a função docente, não é vertical, mas lateralizada, reconhecendo a dimensão de não saber inerente à radicalidade da clínica assumida pelo AT e a experiência do Projeto ATnaRede como espaço para aprendizagens mútuas. Além dos encontros semanais do Projeto de extensão, o mesmo desdobra-se em uma disciplina eletiva semestral, vinculada ao curso de Psicologia e oferecida como extra-curricular para outros cursos, intitulada Introdução à Prática do Acompanhamento Terapêutico, a qual propõe-se como experiência sensível a performatizar o AT, de forma que o percurso na disciplina requer a disponibilidade subjetiva e corporal dos estudantes para vivê-la como um AT, em percursos pelas ruas e espaços públicos e no encontro intensivo com o grupo de colegas. E, finalmente, o ATnaRede também se configura como projeto de pesquisa, por meio do qual buscamos sistematizar o conhecimento produzido através da experiência do AT que realizamos. O desenvolvimento do projeto segue os seguintes passos:
a) constituição do coletivo AT de Residentes Multiprofissionais, estagiários de psicologia e extensionistas (permanência mínima de um ano no Projeto, com ingresso a cada início de semestre)
b) acolhimento, pelo coletivo, das demandas de AT dirigidas ao Projeto por parte de profissionais das equipes da rede intersetorial de serviços;
d) encontros semanais de construção coletiva dos casos e gestão do Projeto;
e) disponibilização de dois a três turnos semanais para realização dos ATs durante a permanência no Projeto;
f) participação em reuniões de rede ou outros espaços de discussão envolvendo a(s) equipe(s) do(s) serviço(s) implicado(s) no cuidado do usuário em AT;
g) participação na disciplina Introdução à Prática do Acompanhamento Terapêutico;
h) participação nos seminários teóricos mensais do Projeto;
i) produção de narrativa referente ao(s) AT(s) realizado(s).
Somados mais de vinte anos de funcionamento, este Projeto propiciou, a um número significativo de estudantes de psicologia e residentes multiprofissionais, além de outros profissionais de psicologia e áreas afins, uma experiência clínica no contexto das redes de atenção psicossocial, tendo a cidade como matéria da clínica.
Beneficiou inúmeros usuários de saúde mental e outras políticas, e suas redes familiares, possibilitando a ampliação de seus laços sociais e reduzindo o número de internações hospitalares. Ao mesmo tempo, fez-se acompanhar de efeitos institucionais importantes, ao trazer, para dentro dos serviços de que são usuários, um conjunto de informações novas, relativas ao contexto da sua vida cotidiana, implicando um outro olhar das equipes sobre esses usuários, requerendo reposicionar-se com respeito ao caso, como coletivo de um trabalho em rede. Cabe considerar que os resultados do AT em geral se mostram no detalhe, no cotidiano dos encontros e na possibilidade de ampliação destes, tanto do acompanhado com as pessoas próximas quanto com os trabalhadores dos serviços. Em muitos casos, as pessoas e serviços próximos ao acompanhado aparentam já estar saturados. Dessa forma, o AT pode aparecer como um respiro para quem é acompanhado, permitindo pensar outras possibilidades de existência. A experiência acumulada do projeto ATnaRede contribuiu para a implantação de experiências similares em cursos de graduação universitária e em projetos de educação permanente junto a gestão estadual e gestões municipais de saúde, além de parcerias diversas com órgãos públicos e com outras universidades. Gerou, também, a realização de diversos eventos, como o Colóquio em dois movimentos: de Porto Alegre a Niterói – Acompanhamento Terapêutico na Rede Pública de Saúde, em 2005 e 2006, em parceria UFRGS e UFF; o III Congresso Internacional de Acompanhamento Terapêutico: Multiversas cidades, andanças caleidoscópicas, tessitura de redes, em 2008, em Porto Alegre; a jornada Acompanhamento terapêutico, universidade e políticas públicas: rede de conversações, reunindo projetos co-irmãos ao Projeto ATnaRede da UFRGS, vinculados a outras universidades no país (PUCSP, UFSC, UFU, URI-Missões), jornada da qual resultou a publicação de um e-book (ed. Rede Unida); o evento comemorativo dos 20 anos de fundação do projeto, Acompanhamento Terapêutico, Universidade e Políticas Públicas: 20 anos ATnaRede, em 2018 em Porto Alegre. Em 2004 a experiência do projeto foi publicada na forma de livro, Acompanhamento terapêutico na rede pública: a clínica em movimento, UFRGS, reeditado em 2008 - que se tornou referência na área, no cenário nacional; tem propiciado a produção de um número importante de artigos publicados em livros e revistas especializadas, participações em congressos e outros eventos, além de subsidiar pesquisas em nível de mestrado e doutorado.
Há muitos artigos e capítulos de livros publicados que versam sobre o AT a partir da experiência do Projeto ATnaRede, dentre os quais, destacamos:
- Livros:
- PALOMBINI, A.L.; PASINI; V.L.; BRONDANI, A.C.; GUERRA, S.Z.; ECKER, D.D. (orgs). Acompanhamento terapêutico, universidade e políticas públicas: rede de conversações, Ed. Rede Unida, 2019 http://editora.redeunida.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Acompanhamento_Terapeutico_final.pdf
- PALOMBINI, A. L.; BELLOC, M.M; CABRAL, K.V.; GONCALVES, L. L.; JOVER, E.R.; KASPER, S.G.; MACHADO, P.S.; MESQUITA, J.R.; RICHTER, E.P.; SEVERO, M.B.R.; SIBEMBERG, N.; SILVA, M.C.C.; FREITAS, V.T.B. Acompanhamento terapêutico na rede pública: a clínica em movimento - 2a. edição revisada. Porto Alegre: UFRGS, 2008, v.1. P.143. https://www.skoob.com.br/livro/pdf/acompanhamento-terapeutico-na-rede-publi/livro:131079/edicao:145407
- BELLOC, M.M.; CABRAL, K. V.; PALOMBINI, A.L.; OLIVEIRA, R. W.; TINOCO, S. G. Além dos muros: Acompanhamento Terapêutico como Política Pública de Saúde Mental e Direitos Humanos. Porto Alegre RS: Rede UNIDA, 2017, v.1. p.137. http://historico.redeunida.org.br/editora/biblioteca-digital/serie-atencao-basica-e-educacao-na-saude/AlmdosMuros.pdf
- Artigos:
- ROCHA, L.P., PALOMBINI, A. L. A clínica do Acompanhamento Terapêutico como pesquisa psicanalítica: uma escrita compartilhada entre vários. Ágora ( PPGTP/UFRJ). , v.20, p.732 - 742, 2017. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S1516-14982017000300732&lng=en&nrm=iso&tlng=pt
- PALOMBINI, A. L. Utópicas cidades de nossas andanças: flânerie e amizade no acompanhamento terapêutico. Fractal , v.21, p.295 - 317, 2009. http://www.scielo.br/pdf/fractal/v21n2/08.pdf
- PALOMBINI, A. L. Acompanhamento terapêutico: dispositivo clínico-político. Psychê (São Paulo. Impresso). , v.18, p.115 - 127, 2006. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psyche/v10n18/v10n18a12.pdf PALOMBINI, A. L.; CABRAL, K.V.; BELLOC, M.M. Acompanhamento terapêutico: vertigens da clínica no concreto da cidade. Estilos da Clínica (USP). , v.1, p.32 - 59, 2005. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-71282005000200003
- PALOMBINI, A. L. Passagens obstruídas: quartos privativos, mínimas janelas. Revista da Associação Psicanalítica de Porto Alegre. , v.24, p.63 - 68, 2002.
- PALOMBINI, A. L. O louco e a rua: a clínica em movimento mais além das fronteiras institucionais. Educação Subjetividade Poder. , v.6, p.25 - 31, 1999. https://siteat.net/analice/
- Capítulos de livros
- PALOMBINI, A.L.; PASINI, V. L.; ECKER, D. D.; CASTRO, I.; SILVEIRA, J. S.; SCHREINER, L.; GUERRA, S. Z. Acompanhamento terapêutico: uma clínica em rede. sustento da vida entre precariedades e riscos In: SaúdeLoucura 10. São Paulo, SP: Editora Hucitec, 2019, v.1, p. 1-15.
- PALOMBINI, A.L. Escuta, rede, tardança e roda In: Acompanhamento terapêutico, universidade e políticas públicas: rede de conversações. Porto Alegre RS: Rede Unida, 2019, v.1, p. 81-88. http://editora.redeunida.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Acompanhamento_Terapeutico_final.pdf
- PASINI, V.L. Déjà vu. Onde eu já ouvi esta narrativa? Quem pronunciou? In: Acompanhamento terapêutico, universidade e políticas públicas: rede de conversações. Porto Alegre RS: Rede Unida, 2019, v.1, p. 47-51. http://editora.redeunida.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Acompanhamento_Terapeutico_final.pdf
- GUERRA, S. Z.; PASINI, V. L.; PALOMBINI, A.L. Um tempo para andança e desejo In: Acompanhamento terapêutico, universidade e políticas públicas: rede de conversações. Porto Alegre RS: Rede UNIDA, 2019, v.1, p. 89-100. http://editora.redeunida.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Acompanhamento_Terapeutico_final.pdf
- PALOMBINI, A.L. 25 anos depois, um pouco da estrada em que fiz meu chão: acompanhamento terapêutico e reforma psiquiátrica In: 25 anos da lei da reforma psiquiátrica no rio grande do sul. Porto Alegre RS: Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, 2018, v.1, p. 245-261. https://lume.ufrgs.br/handle/10183/179346
- STENERT, F.; PALOMBINI, A.L.; SIMONI, A. C. R. A cidade como potência, errância e abrigo: Relatos e traçados do Acompanhamento Terapêutico In: ALÉM DOS MUROS: Acompanhamento Terapêutico como Política Pública de Saúde Mental e Direitos Humanos. Porto Alegre RS: Rede UNIDA, 2017, v.1, p. 138-161. http://historico.redeunida.org.br/editora/biblioteca-digital/serie-atencao-basica-e-educacao-na-saude/AlmdosMuros.pdf
- PALOMBINI, A.L.; PASINI, V. L. As redes e os muros da cidade: andanças no acompanhamento terapêutico In: ALÉM DOS MUROS: Acompanhamento Terapêutico como Política Pública de Saúde Mental e Direitos Humanos. Porto Alegre RS: Rede UNIDA, 2017, v.1, p. 56-67. http://historico.redeunida.org.br/editora/biblioteca-digital/serie-atencao-basica-e-educacao-na-saude/alem-dos-muros
- PALOMBINI, A.L.; KRUG, J. C.; WOLSKI, R. O. Tecendo Redes: modos de habitar a cidade In: ALÉM DOS MUROS: Acompanhamento Terapêutico como Política Pública de Saúde Mental e Direitos Humanos. Porto Alegre RS: Rede UNIDA, 2017, v.1, p. 37-42 http://historico.redeunida.org.br/editora/biblioteca-digital/serie-atencao-basica-e-educacao-na-saude/AlmdosMuros.pdf
- ROCHA, L. P.; PALOMBINI, A.L. O acompanhamento terapêutico como dispositivo clínico-político de atenção à adolescência na saúde mental. In: Psicologia Social e Saúde: da dimensão cultural à político‐institucional. Florianópolis SC: Edições do Bosque, 2015, v.1, p. 343-361.
- PALOMBINI, A.L. Acompanhamento terapêutico na rede pública: Programa de ensino, pesquisa e extensão In: Curso de psicologia da UFRGS 40 anos. Porto Alegre RS: Editora da UFRGS, 2014, v.1, p. 161-162. https://www.academia.edu/33542747/Curso_de_Psicologia_da_UFRGS_40_anos
- PALOMBINI, A. L.; OLIVEIRA, R. W. Andanças: artes de habitar uma cidade In: Por que a cidade? Escritos sobre experiência urbana e subjetividade. Niterói: UFF, 2012, p. 83-103.
- PALOMBINI, A. L. Psicanálise a céu aberto? In: Psicose. Aberturas da clínica. Porto Alegre: APPOA / Libretos, 2007, p. 156-175.
- PALOMBINI, A. L. Formação profissional em interação com a comunidade: a supervisão na universidade In: Psicologia e políticas públicas: Experiências em Saúde Pública. Porto Alegre: Conselho Regional de Psicologia da 7a. Região, 2004, v.1, p. 56-73. https://issuu.com/crprs/docs/psicologiapoliticaspublicas
- PALOMBINI, A. L. A ética nas micropolíticas de atenção à loucura In: Loucura, ética e política: escritos militantes. São Paulo: Casa Do Psicólogo / Conselho Federal De Psicologia, 2003, p. 159-163.
- PALOMBINI, A. L. Das mãos de Deus aos avatares da ciência: o estigma da diferença In: Psicologia e Educação: multiversos sentidos, olhares e experiências. Porto Alegre: UFRGS, 2003, p. 117-127.
- PALOMBINI, A. L. Psicopatologia na vida cotidiana. In: Cadernos de AT: uma clínica itinerante Porto Alegre: Grupo Circulação, 1998
- Relatos:
Reproduzimos aqui trechos de duas narrativas que refletem a conversa realizada em duas rodas de conversa, respectivamente: uma com acompanhantes terapêuticos e outra com pessoas acompanhadas, que integram o projeto ATnaRede.
Narrativa dos acompanhados:
“Para nós o AT permitiu conhecer lugares, ter mais liberdade de sair, buscar locais como o GeraPOA, em que se faz trabalhos manuais para vender. Com o AT, nós temos mais autonomia. Autonomia, para nós, significa coisas como sair sozinho, andar na rua, lidar com dinheiro, ir ao banco, trabalhar... São coisas como essas que nós aprendemos no AT: ir aos lugares sozinha/o, atravessar a rua, pegar ônibus, cumprimentar as pessoas.
No AT, nós conversamos e isso ajuda, falamos dos nossos problemas, de como anda a vida e o lugar onde moramos. O AT faz com que se conheça mais a pessoa. Dá para contar da vida, se as coisas estão boas ou ruins. Sentimos que podemos confiar no nosso AT, para contar essas coisas. Quando contamos para outras pessoas, elas não ajudam, fazem fofoca – o AT não. O AT é diferente de outros lugares por onde já passamos, onde já estivemos. [É uma relação] feita de amizade e confiança. As pessoas que fazem AT com a gente têm paciência conosco, nos ajudam, já nos ensinaram bastante coisa, podemos dizer a elas o que estamos sentindo, podemos desabafar, elas sabem da tua ruim, sabem da tua boa. Gostamos muito delas. Elas acompanham a gente nas situações em que não estamos bem.
Quando tem situações difíceis na vida, dá para conversar com quem faz AT com a gente, o at pode nos ajudar com as situações difíceis que passamos na vida. Achamos que o nosso AT é nota dez.”
Narrativa dos acompanhantes:
“Ouvimos em aula que o AT seria a clínica levada à radicalidade. É tão radical que sentimos em nossos corpos esse encontro. [...] Isso é bem diferente do que é o comum – a separação, a distância. Nós achamos muito legal podermos estar ali sendo nós mesmos e não tendo que forjar uma neutralidade. Para nós faz todo sentido que a gente possa se colocar, que seja uma clínica que inclua nossos afetos. Ao mesmo tempo, às vezes temos que deixar o nosso Eu para aparecer o Eu do outro. [...] Nós estamos ali para acompanhar, então precisamos trabalhar isso de nos segurarmos, de nos contermos para deixar aparecer o outro, mas, ao mesmo tempo, quando o outro transbordar, nós estarmos ali, presentes... é uma segurança. Gostamos de pensar na ideia de que às vezes vamos caminhar ao lado, às vezes vamos caminhar atrás, às vezes à frente, depende da situação. Não é neutralidade! Ou, se há neutralidade, é no sentido ético de não atuar nossos pré-conceitos. Percebemos o quanto é potente quando colocamos nossos afetos. [...] Às vezes queremos ser tudo, saber tudo, mas damo-nos conta do quanto aproxima a relação mostrar que somos humanos, que esquecemos as coisas, que temos dor de cabeça, dor de barriga... sermos nós mesmos, sabe? Achamos que isso tem a ver com o tema da amizade que se coloca no AT, pois nós não estamos ali como terapeutas somente, mas também como esse amigo que ouve e se joga no que está acontecendo. Não ficamos só no ahãn, ouvindo e fazendo um inquérito. [...] Estamos ali disponíveis para ouvir sem julgar, para conversar, para rirmos juntos também. Temos um olhar diferenciado daqueles olhares de estranheza que nossos acompanhados recebem na rua, por exemplo. Nosso olhar é um olhar que confia na pessoa, que acredita nela, um olhar de afeto, de amor mesmo – uma amorosidade fora dos laços familiares, sem preconceito ou crítica. Nosso olhar não é focado só no sofrimento, mas também nas potencialidades, nas outras histórias que essa pessoa possa nos contar para além do sofrimento. Nós apostamos nisso, em outras possibilidades de existência. Às vezes somos os únicos que apostamos nos sujeitos que nós acompanhamos. O AT termina sendo um respiro para esses sujeitos. Percebemos que essa experiência produz mudanças na vida dos nossos acompanhados. Mas não é exatamente o que o acompanhante idealiza, que é de fazer uma revolução, salvar a vida daquela pessoa ou, então, fazer voltar para a escola. Às vezes são mudanças muito pequenas e gigantemente significativas, como conseguir sair para a rua. Sair para a rua pode significar ganhar um espaço de liberdade cotidiana. Liberdade de sair do espaço privado da família para o espaço público. Liberdade do desejo. Liberdade para interagir de outro jeito, com espaço para o lúdico, para o brincar...”